Bem vindos e bem vindas ao blog da disciplina Prática e Atualização do Direito 1 - Direito Achado na Rua, da Faculdade de Direito da UnB.
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PAD 1 - Direito Achado na Rua
domingo, 28 de outubro de 2012
quinta-feira, 6 de setembro de 2012
Comissão Nacional da Verdade: uma breve introdução
Texto apresentado na aula do dia 04/09
Por Daniel Guedes
O
presente texto tem como finalidade apresentar, de modo sucinto e direto, a
estrutura, o propósito e os argumentos pró e contra a Comissão Nacional da
Verdade. Para tanto, inicialmente, será necessário observar, brevemente,
características das comissões da verdade de forma geral.
As
comissões da verdade são mecanismos oficiais, os quais têm sido amplamente
utilizados no mundo, criados para averiguar, como forma de esclarecer o passado
histórico, violações e abusos aos Direitos Humanos. Seu funcionamento prioriza
escutar as vítimas das arbitrariedades cometidas, bem como conhecer e entender
o padrão das violações praticadas. Deve-se esclarecer também que tais comissões
são órgãos temporários investidos de poderes para identificar todos os fatos
ocorridos e todas as pessoas que participaram desse processo; tanto as que
sofreram violências, quanto as que as praticaram.
A
implementação das comissões da verdade permitem (re)inserir a questão do
autoritarismo e suas consequências, promovendo a reflexão e prevenindo ações
violadoras dos Direitos Humanos. Nesse sentido, cumpre destacar que as
comissões estão num contexto de Justiça de Transição, a qual diz respeito como
uma sociedade lida com um passado de violência e repressão, na passagem de
regimes autoritários para a democracia. Portanto, representam, por vocação, a
materialização de um marco histórico na passagem de um período para o outro.
O
objetivo final das comissões é a produção de um relatório que permite à
sociedade o conhecimento detalhado do regime opressor e violador, bem como a
realização de recomendações que visam aprimorar as instituições do Estado
(especialmente aquelas que lidam com a segurança pública) e contribuição para
uma política definitiva de não repetição. São também objetivos das comissões:
(i) descobrir, esclarecer e reconhecer abusos do passado, dando voz às vítimas
por meio de testemunhos, os quais devem ser registrados; (ii) combater a
impunidade (revelar as causas e consequências, o modus operandi e as motivações do regime que cometeu os atos de
violência e repressão, assim como seus perpetradores); (iii) restaurar a
dignidade e facilitar o direito das vítimas à verdade; (iv) acentuar a
responsabilidade do Estado e recomendar reformas do aparato institucional
(assim há o reconhecimento público e oficial de abusos cometidos); (v) reduzir
conflitos e promover a reconciliação e a paz.
Além
disso, cabe explicitar que 39 comissões da verdade já foram instaladas em todo
o mundo, sendo a primeira em Uganda, em 1974. Embora não sejam idênticas,
todas, em geral, possuem aspectos em comum, tais como: os membros devem ser de
reconhecida integridade e com autoridade moral e intelectual (não devem ser
membros nem perpetradores das violências praticadas nem as vítimas, assim como
representantes de setores partidários nem pessoas vinculadas aos órgãos
públicos que se envolveram nos atos de violência); os membros e seus assessores
devem ter autonomia, imunidade e estabilidade; suas atribuições devem ser
amplas o suficiente para que possam: requisitar testemunhas, documentos e
informações, visitar locais onde violações foram cometidas; devem existir
critérios claros e objetivos para a convocação de testemunhas; os membros têm
autonomia para decidir se as sessões serão públicas ou privadas, mas todas
devem ser gravadas e registradas (a maioria é pública); a maioria das comissões
teve duração de dois anos (variou-se de seis meses a três anos).
Deve-se
ressaltar também que há diferenças entre as diversas comissões a começar pelo
nome, visto que muitas não possuem o nome “Comissão da Verdade”. Ainda, dentre
outras diferenças, estão: as especificações de seus mandatos, dos termos de
investigação e principalmente do poder e autonomia com que forem investidas, refletindo
as necessidades, possibilidades e realidades de cada país. Também seus
resultados práticos finais se diferenciaram em razão dos mesmos fatores.
É
inevitável, por analisarem fatos que poderiam ser sujeitos a processo judicial,
uma comparação entre comissões da verdade e o sistema judiciário. Certamente,
as comissões são independentes do mundo legal e não detêm o mesmo poder que os
tribunais, não podendo, por exemplo, condenar, civil ou penalmente, nenhuma
pessoa nem obrigar ninguém a testemunhar. Todavia, por ter uma função mais
específica, as comissões investigam o tema com muito mais profundidade do que
os tribunais, bem como suas características, mais flexíveis, permitem chegar a
conclusões várias vezes inacessíveis aos processos judiciais. Assim,
geralmente, o resultado final é considerado “verdade histórica” em
contraposição à “verdade judicial”, donde, de acordo com especialistas, reside
a força moral e política das comissões.
Realizadas
tais considerações acerca das comissões da verdade, cabe a analisar, então, o
contexto brasileiro. Nessa linha, deve-se esclarecer que a Comissão Nacional da
Verdade não é o primeiro marco da Justiça de Transição em nosso país. Assim, já
foram criadas a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos e a Comissão de
Anistia. A primeira, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, teve como
objetivo a reparação aos familiares
de mortos e desaparecidos entre 1961 e 1985, já a segunda, durante o
governo de Luiz Inácio Lula da Silva, propicia medidas indenizatórias de
reparação a pessoas atingidas por atos arbitrários cometidos antes da
promulgação da Constituição de 1988.
Após
quase dois anos de tramitação do projeto de lei 7376, no Congresso Nacional, a
Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, criou a Comissão Nacional da Verdade com
“a finalidade de examinar e esclarecer as graves
violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art.
8o do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias (de 1946 a 1988), a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e
promover a reconciliação nacional”.
A Comissão possui sete membros, nomeados pela Presidente, de reconhecida
idoneidade e conduta ética, identificados com a defesa da democracia e da
institucionalidade constitucional, bem como com o respeito aos direitos humanos
(auxiliados, cada um, por dois assessores) e terá duração de 2 anos a partir de
sua instalação, devendo apresentar, ao final do período, relatório circunstanciado contendo as atividades realizadas, os
fatos examinados, as conclusões e recomendações.
Em 16 de maio de 2012 foi, oficialmente, instalada a Comissão
Nacional da Verdade, sendo nomeados membros: (i) Cláudio Fonteles (Procurador
Geral da República entre 2003 e 2005); (ii) Gilson Dipp (Ministro do STJ e,
desde 2011, do TSE); (iii) José Carlos Dias (Ministro da Justiça no governo de
Fernando Henrique Cardoso); (iv) José Paulo Cavalcante Filho (advogado e
consultor); (v) Maria Rita Kehl (psicanalista e cronista); (vi) Paulo Sérgio
Pinheiro (diplomata e professor da USP) e (vii) Rosa Maria Cardoso da Cunha
(advogada criminalista e professora).
Durante a cerimônia de instalação, a Presidente Dilma Rousseff
afirmou que a Comissão não teria caráter revanchista, que seriam respeitados os
pactos nacionais (referência principalmente à Lei da Anistia, objeto de
controvérsias e polêmicas entre setores da sociedade civil e militares) e que a
Comissão seria de Estado, e não de governo. Além disso, em entrevista concedida
à Folha, no mesmo dia da instalação, o membro Gilson Dipp afirmou que a
Comissão não tem poder para revisar a Lei da Anistia, vez que não possui poder
jurisdicional nem persecutório, e que o STF já decidiu pela não revisão da Lei.
Diante desse contexto, vários foram os argumentos favoráveis à Comissão
e seus objetivos. Nesse sentido, de acordo com Celso Lafer, a Comissão tem como
finalidade a busca da verdade factual a qual contribuirá com a História, embora
não seja História. Isto é, o seu papel seria o de constituir um local de memória
da verdade factual da violação de Direitos Humanos, no Brasil, no período
determinado. E a memória, diferente da História, escolhe, seleciona e é vivida
no presente com preocupação para o futuro. Assim, a Comissão deverá indicar as
consequências das ações relativas àquele período, para a vida política
democrática, em contraposição à ocultação dos atos, pelo Estado e parte da
sociedade, o que contribuirá para o fortalecimento do princípio da
transparência. Para Fábio Konder Comparato, a importância da Comissão está
resumida na frase “aqueles que se recusam a lembrar o passado estão condenados
a repeti-lo”.
Representantes de diversos setores da sociedade civil, como
engenheiros, advogados (por meio da OAB nacional), juízes, artistas,
intelectuais, educadores e cineastas apoiaram a instauração da Comissão.
Por outro lado, há também críticas à Comissão. Dentre elas,
podemos citar a crítica feita por Ives Gandra Silva Martins, quem sustenta não
ser adequada a ausência de historiadores entre os membros, já que a finalidade
é “resgatar a verdade histórica de um período de 42 anos”. Afirma, ainda, que a
Comissão é seletiva ao não se propor, segundo ele, examinar as ações praticadas
pelos guerrilheiros e, por fim, que a constituição e instalação da mesma são
inoportunas, pois não será possível alcançar nenhum resultado profícuo, mas apenas
“remoer feridas” (destaca-se que não há, até o presente momento, consenso
expresso, entre os membros, sobre quais atos deverão ser apurados; se todas as
violações aos Direitos Humanos; se apenas aquelas perpetradas pelos
representantes do Estado).
Outra crítica à Comissão é feita por João Mellão Neto, o qual
afirma, inicialmente, que o próprio nome está equivocado por usar o termo
“Verdade”, ao indagar verdade de quem. Também sustenta que a Comissão, como
está formada (membros e objetivos), representa a “esquerda” e que não fará uma
investigação ampla e adequada, não se verificando os atos de violência de ambos
os lados.
Luiza Erundina criticou a ausência de um debate mais amplo, por
meio de audiências públicas e discussões de especialistas, para a constituição
da Comissão e, também, que a mesma não tem orçamento próprio o que limitará a
sua atuação.
Já alguns militares entendem que a Comissão, como está formada, é
parcial e significa um gesto de revanchismo e agressão às Forças Armadas.
Ainda, até mesmo alguns ativistas de Direitos Humanos criticaram a
Comissão por ela não deter poder de punição, o que representaria um
enfraquecimento da mesma, não contribuindo para o alcance da justiça. Por
último, há críticas com relação à duração da Comissão, a qual não seria
suficiente para um trabalho adequado.
Ante essas considerações, percebe-se que os argumentos favoráveis
e contrários, e as críticas são de diversas naturezas, os quais variam desde a
constituição em si da Comissão até a forma como essa foi realizada.
Em que pesem os argumentos contrários à constituição, é necessário
sustentar que a investigação, a revelação e o reconhecimento detalhado dos
fatos ocorridos no período autoritário são imprescindíveis, e mesmo
inevitáveis, para o aprofundamento e consolidação de uma Nação democrática.
Nessa linha, não é coerente existir um Estado, que se objetiva democrático, não
conhecer e admitir seu passado e suas consequências, pois, a partir desses
passos, a busca de meios e opções para efetiva construção e fortalecimento da
democracia é mais fundamentada e madura.
Desse modo, no contexto brasileiro, a constituição da Comissão
Nacional da Verdade representa, sim, um evento imperativo, do qual resulta a
devida passagem para um estágio mais consistente da democracia.
Ressalta-se,
contudo, que, de fato, trata-se de um tema delicado, até mesmo, por sua
relativa proximidade temporal com o período em referência. Assim, a sua
constituição deveria procurar, ao máximo, a minimização de equívocos e, nesse
aspecto, cumpre destacar, preliminarmente, que o nome dado “Comissão Nacional
da Verdade”, embora seja igual ou similar aos dados em alguns outros países, é,
no mínimo, pretensioso, e não caracteriza, de modo mais adequado, a História
nem a memória do período.
Além disso, a despeito de os membros da Comissão atenderem, em
grande parte, às exigências para suas nomeações, o argumento de não haver não
haver pelo menos um historiador, dentre aqueles, é, sim, válido, vez que a
missão em questão está, essencialmente, relacionado à História. Também são
válidas as críticas quanto (i) à ausência de orçamento próprio, pois realmente
pode limitar a atuação da Comissão, (ii) ao argumento de que deveria ter havido
um debate mais amplo, principalmente no seio da sociedade civil, antes da
constituição da Comissão e, ainda, (iii) ao de que o tempo para a conclusão dos
trabalhos (2 anos) não é suficiente para um trabalho apropriado.
Quanto às críticas de que essa é uma Comissão de “esquerda”, estas
parecem não prosperar, vez que há membros com diferentes experiências e ações
ao longo de suas carreiras, assim como há aqueles que foram indicados para
função política de direção em governos considerados de direita e outros em de
esquerda. Portanto, tal crítica, em princípio, não se aprofunda, resultando, em
geral, em comentários sem maiores fundamentações.
No que diz respeito à crítica de que a investigação deveria ser
ampla (abranger os dois lados), cabe ressaltar que não há dúvidas, em caso de
exame, de que os atos de violência perpetrados pelos representantes do Estado
devem ser averiguados. Isto porque o fundamento básico da Comissão é reconhecer
os fatos pretéritos; buscar, por meio desse ato, evitar a repetição dos mesmos;
e, com efeito, aprimorar a democracia, ou seja, a missão da Comissão é,
fundamentalmente, voltada para o futuro, para a consolidação do regime
democrático. Assim, deve-se admitir que os atos de violência e repressão
praticados pelo Estado e seus representantes, de fato, minaram a democracia,
sendo, portanto, devida sua investigação, em conformidade com os preceitos e
missão da Comissão.
Por outro lado, a controvérsia maior, nesse ponto, está em relação
aos atos praticados pelos guerrilheiros; se devem ou não ser averiguados também.
Ora, quanto aos objetivos e atos dos guerrilheiros não é tão fácil perceber se
eram autoritários ou não, se comparados aos dos representantes do Estado, o que
iria de encontro à construção democrática. Além disso, sempre que o Estado faz
uso de seus meios para impor sua vontade, pela força e repressão, não há
dúvidas de que praticou atos contrários à democracia e justamente por quem deferia
defendê-la, já no caso oposto, o dos guerrilheiros, a situação não é tão
cristalina, ou seja, os riscos à democracia não são tão evidentes, sendo,
aparentemente, mais especulações do que algo concreto.
Por tudo o
que foi exposto, parece que, em um primeiro momento, por mais que a Comissão possa
investigar ambos os lados, a concentração dos esforços, em razão da missão da
Comissão, deve ser orientada para averiguação dos atos praticados pelos
representantes do Estado.
Diante de todo o exposto, conclui-se que a constituição da
Comissão Nacional da Verdade representa uma necessidade para o avanço
democrático brasileiro e deveria, sim, ser realizada, embora sua forma, de modo
geral, isto é, o tempo (sua duração), membros, processo de constituição,
termos, não são os mais adequados, possuindo equívocos que podem prejudicar o
resultado final a ser apresentado. Nesse sentido, cresce a importância, da
sociedade, como um todo, participar ativa, constante e responsavelmente dos
trabalhos da Comissão.
sábado, 7 de julho de 2012
DIREITOS DA PERSONALIDADE E A PUBLICIDADES DAS REDES SOCIAIS: UMA TENSÃO NECESSÁRIA?
Por João Guilherme Lima Candido e Victor Delábio Ferraz de Almeida Meira
No início do século XXI, expandiu-se a quantidades de sites destinados à criação de perfis virtuais, os quais “representavam” seus donos no mundo cibernético, e à elaboração de listas de amigos vinculadas aos perfis dos usuários. “Friendster” foi o maior e mais popular de todos eles. A divulgação de imagens vinculada à comunicação por mensagens instantâneas trouxe, aos dias atuais, o formato das redes sociais como nós as conhecemos. A demanda foi tão grande que os servidores do “Friendster” não conseguiam suportar o monstruoso tráfego de dados, o que acabava gerando “quedas” inesperadas e constantes.
Estima-se que mais de 80% dos internautas de todo o planeta têm perfis em redes sociais. O maior site de relacionamentos do Brasil, o Facebook, possui uma estatística interessante: 27% dos cadastrados têm entre 18 e 24 anos. Não se pode ignorar, é verdade, que uma parcela considerável desse segmento é composto de menores que mentem a idade em seus perfis. Uma ferramenta tão robusta, capaz de publicizar opiniões, imagens, informações pessoais e pontos de vista tem precipitado a entrada de pessoas cada vez mais jovens num ambiente de responsabilidades jurídicas muitas vezes ignoradas até por usuários mais experientes.
Os direitos da personalidade representam um importante campo de normas a que se deve atentar quando se trata da utilização dos mecanismos e ferramentas das redes sociais. A divulgação de imagens e fotos que veiculam momentos de intimidade (que vão de uma simples “bebedeira” até uma orgia - caso da estudante Júlia Bueno) pode ser uma atividade arriscada e, muitas vezes, criminosa. As lesões aos direitos dos envolvidos podem não cessar mesmo com a remoção da foto ou da imagem indesejadas no perfil do divulgador.
A Constituição e o Código Civil garantem ao cidadão brasileiro o direito de defender sua honra, sua imagem, seu nome, sua intimidade, sua integridade moral e física e sua vida privada. O Código Civil afirma que:
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Veja que, como afirmado anteriormente, se a fotografia infame não houver desaparecido em tempo hábil, o dano à imagem do lesado restará caracterizado e a indenização será cabível.
Casos em que a indenização é cabível, esta é mais fácil de ser alcançada pelo interessado quando a situação veiculada pela imagem não tenha sido fruto de sua vontade ou um ato voluntário que a vítima obviamente tentou esconder. Além disso, outra variável que influencia na concessão da indenização é a fama da pessoa que se viu lesada: enquanto figuras públicas movem processos com quantias exorbitantes baseados em simples postagens no facebook, a maioria das pessoas tem que se contentar com o Juizado de Pequenas Causas, que dá, no máximo, dez mil reais de consolo ao ofendido.
Quando a publicação não parte de usuários comuns da rede social, mas do próprio servidor, a situação torna-se ainda mais complicada. É necessário recorrer à via dada pelo próprio site, devendo-se preencher muitos campos e termos de compromisso a fim de que, quiçá, seja removido o conteúdo indesejado. Se isto não acontecer, o ônus fica com a vítima, já que, segundo advogados especializados, as redes sociais demoram a retirar o material, especialmente o Orkut (pertencente ao Google), dando tempo suficiente para que o conteúdo se espalhe, potencialmente de forma viral, rede mundial de computadores adentro. Algumas empresas especializaram-se em rastrear estes materiais indesejados pela internet e eliminá-los um por um. Todavia, é um serviço caro, que fica na casa dos milhares de reais.
Existem implicações das redes sociais ainda no mundo do trabalho. Inicialmente, quando os chamados headhunters – pessoas que buscam os melhores candidatos para trabalhar em uma empresa ou outra – deparam-se com um perfil em alguma rede social, eles procuram por certos indícios de irresponsabilidade ou outras qualidades não desejáveis para um empregado. Por exemplo, se encontram conteúdo considerado imoral pelo senso comum, como fotos de festas onde o dono estivesse inebriado por uso de álcool ou outras substâncias ilícitas, brincadeiras de humor negro e assim por diante, dificilmente isto não será considerado na seleção dos candidatos. Algumas vezes, a conduta que os empregadores não desejam não é demonstrada pelos excessos cometidos, pois isto acontece, mesmo que a frequência varie, com todos nós. O problema, no caso, seria a falta de discrição que o candidato mostra ter quando torna públicas essas ocasiões.
O segredo para lidar com a exposição que as redes sociais propiciam, quando se pensa em sua relação com o mundo do trabalho é portar-se, naquelas, da mesma forma que se portaria neste, com zelo e cautela, pois as consequências das ações no ambiente virtual muitas vezes são as mesmas daquelas no mundo real, apesar dos dois serem tão diferentes. Exemplo disto ocorre quando um empregado compartilha no Facebook informação que denigra a imagem de seu empregador ou empresa, tal qual a perda de clientes, o não fechamento de um negócio ou a impossibilidade de participar de uma licitação. Conforme jurisprudência do nosso Supremo Tribunal Federal as pessoas jurídicas possuem alguns Direitos da Personalidade, como o direito à honra, boa fama, entre outros. Por isso, uma postagem com o referido conteúdo poderia ensejar, sem maiores discussões, uma demissão por justa causa, de acordo com o artigo 482 da CLT (ato lesivo da honra e boa fama do empregador).
Um caso interessante que pode demonstrar as consequências do uso indevido das redes sociais é o do brasileiro que foi visitar a Austrália, mas foi proibido de entrar no país após as autoridades locais verem em seu Facebook que o turista havia combinado com um colega australiano de tocar em determinada casa noturna de lá. Devido ao fato de só ter visto para fins de turismo, o brasileiro foi obrigado a retornar a sua terra natal.
As redes sociais são, de fato, um importante instrumento de comunicação que proporciona uma grande liberdade a seus usuários na hora de se comunicar com seus colegas virtuais, permitindo que se relacionem apenas com pessoas com quem tenham interesses em comum. O comum é que os jovens se comuniquem de forma despojada com conhecidos da escola, faculdade, festas, etc.; enquanto que os mais velhos se agrupem com seus antigos amigos, por vezes com quem não se encontravam há muito, e compartilhem de velhas histórias, gírias e memórias. Isto ocorre sem que um grupo cause estranhamento ou incômodo a ninguém, exatamente porque as agregações se dão por interesses comuns. Assim, as redes sociais têm potencial para durar muito tempo, dependendo apenas da existência da internet. Por isso devemos perceber o desafio que esta ferramenta de comunicação em massa apresenta ao Direito, que deve agora tutelar todas as formas de interação interpessoal que ocorram no ambiente das redes sociais. Enquanto isso, aquele que utiliza tal ferramenta ter consciência que a responsabilidade que recai sobre ele no mundo virtual é praticamente a mesma que aquela do mundo real. Com isso, propõe-se que seja dada orientação desde cedo para que as pessoas não caiam em armadilhas que elas mesmas criaram. Isto seria uma responsabilidade tanto dos pais, que já se familiarizaram com a inovação quanto das escolas, em disciplinas que abordassem direitos e deveres ligados à cidadania e à Personalidade.
O PROCESSO DE JUDICIALIZAÇÃO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE
Por Bruno Carvalho Tavares e Vitor Coelho
Um dos problemas mais sérios
enfrentados atualmente pela população brasileira é a baixa qualidade dos
sistemas de saúde e a desarticulação entre as instituições públicas e privadas,
o que acarreta escassez de medicamentos e equipamentos hospitalares. O acesso a
bons serviços de saúde é ainda inexistente para milhões de brasileiros e muitos
se obrigam a passar por situações degradantes e extremas mesmo para tratar de
problemas corriqueiros e simples.
Garantida pela Constituição de 1988,
a saúde é direito de todos e dever do Estado. Garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença, de outros agravos
e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação. Direito que nasceu levando em conta a tradição e as
demandas dos movimentos sanitaristas então vigentes.
No entanto, após a confirmação na
Carta Magna, as ações judiciais firmadas pela busca de
direitos levaram à dicotomia entre privilegiar o indivíduo ou o coletivo, e ao
dilema enfrentado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), onde a participação
do judiciário, fiscalizando, significa o combate a possíveis fraudes e, ao
mesmo tempo, ao excesso de ordens judiciais, podendo dificultar a
universalidade da saúde.
O Sistema Único de
Saúde - SUS - criado para integrar uma rede regionalizada e hierarquizada que
constitui um sistema único, e que garantiu o direito do sistema privado de complementar,
na saúde, o sistema público mediante contrato ou convênio, foi organizada da
seguinte forma: I -
descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento
integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços
assistenciais e III - participação da comunidade.
Contudo, a criação
de órgãos de fiscalização pelo Estado, entre eles o principal órgão regulador e
fiscalizador do sistema de saúde, a Agência Nacional de Saúde – ANS, e a
criação da lei Nº 9.656/98 (lei que regulamenta os contratos fixados pelas
empresas privadas de saúde, com responsabilidade da ANS em definir as
diretrizes a serem seguidas e com a garantia de que o direito dos usuários
teriam preponderância e os direitos à saúde maior efetividade) levaram o SUS a
uma limitação dos procedimentos, limites como os que fazem os usuários a usufruírem
do tratamento apenas no decorrer de um período determinado, como por exemplo,
um portador de câncer teria uma determinada quantia de radioterapia ou
quimioterapia por ano, ou ainda o paciente com necessidade de atendimento
ambulacral, cuja recuperação deveria se dar em 12 horas, sob pena de despejo
caso o paciente não fosse capaz de arcar com os gastos do leito. Exemplo claro
de que o excesso burocrático e regulatório prejudica a qualidade do sistema
público de saúde.
Outra
responsabilidade do SUS é a distribuição de medicamentos, portaria definida em
1998 que garantiu a Política Nacional de Medicamentos. A Lei nº 8.080/90, em
seu artigo 6º, estabelece como campo de atuação do Sistema Único de Saúde - SUS
a “formulação da política de medicamentos (...) de interesse para a saúde
(...)”.
O
SUS é regido por princípios universalistas e não discrimina o atendimento
segundo a classe econômica dos usuários, seguindo preceitos
como o de que o direito à saúde deve ser objeto de garantia a um sistema
igualitário, sem distinção de classe, gênero ou qualquer outro fator de seleção
e que dê proporções iguais ao acesso nos mais altos níveis de saúde. Por ser um
sistema único e universal, está dentro de suas determinações despesas de
medicamentos e tratamentos, mas uma gestão complicada e uma administração
desordenada acabaram por transformar o sistema publico de atendimento numa
estrutura ruim de assistência às classes mais pobres ou a aqueles incapazes de
pagar por planos de saúde privados melhores. No entanto, mesmo as classes mais
altas podem ser afetadas por essa ineficiência, pois muitos convênios privados,
mediante contratos com o governo, não cobrem totalmente as necessidades do
cliente, que se vê obrigado a obtê-lo na rede pública. Consequentemente, a
pressão para recorrer no judiciário aumenta.
Em meio a esse
cenário, tornou-se prática constante o recurso nos tribunais para obter
tratamentos médicos de difícil acesso nas redes publica. A judicialização das
políticas públicas de saúde cresceu vertiginosamente nos últimos 10 anos e a
busca do auxilio judicial para resolução de questões a priori da
responsabilidade da administração local (e não do judiciário) trouxe algumas consequências
degradantes para o próprio direito a saúde.
A judicialização
aparentemente funciona como uma válvula de escape para os problemas, mas não os
resolve completamente e ainda gera outros. Logicamente, ela possui um papel
fundamental na segurança de direitos básicos e em alguns casos é realmente
necessária para se estabelecer justiça. O argumento da proteção da vida humana que
sempre seduz facilmente o julgamento, consequentemente, perdendo muito do seu
valor jurídico por um apelo emocional forte, e mesmo as normas administrativas
do SUS (Sistema Único de Saúde) pouca influencia exercem, o indivíduo
simplesmente afirma que não tem condições de comprar o remédio ou tratamento
especificado, mas sem ele sua condição física corre sérios riscos. Com isso o
excesso de demanda e a possibilidade de que o paciente morrerá sem o referido
medicamento potencializa um grande número de causas favoráveis à distribuição.
Existe uma
grande margem de sucesso nos tribunais usando esse argumento, mesmo quando o
próprio remédio é de demasiado custoso e poder-se-ia substituí-lo por outro
muito mais barato. Exemplos claros disso ocorrem quando o judiciário determina
a compra de medicamentos caríssimos (muitos com valor superior a 15 mil reais),
sem registro na ANVISA e sem licitação. Simplesmente força-se a Secretária de
Saúde a comprá-los em estado de urgência, fora de preço de mercado. Nos casos
em que o remédio é padronizado, sua estocagem é comum, e, portanto não chega a
custar tanto. Porém, para aqueles não padronizados, o preço pode ser elevado se
(como geralmente ocorre) apenas um laboratório produzi-los, exercendo um
monopólio que o permite determinar um custo mais alto.
Dado o teor emergencial dessa
compra, recorre-se ao uso de verbas provenientes de um fundo reservado para situações
extraordinárias, um “suprimento de fundos”, causando uma transferência de
dinheiro público de determinados projetos também importantes para a sociedade
para o cumprimento da decisão do judiciário.
Contudo, ainda assim os medicamentos essenciais não estão ao alcance de toda a sociedade,
considerando que os medicamentos de alto custo não ocupam mais o papel
secundário que se imaginava (Introdução
Crítica ao direito à saúde – 4º volume da série O direito achado na rua). Há
ainda um problema maior, onde muitas demandas são por medicamentos que ainda
estão em fase de teste.
Outro forte
argumento defende que a judicialização da saúde acarreta em um privilégio das
camadas sociais com maiores rendas e com condições de pagar pelo medicamento,
pois estimativas afirmam que a maior parte dos processos é pago a advogados
particulares e que o custo médio de uma ação, para aquisição de medicamentos,
reside em uma faixa bastante superior a quantia disponível à maioria da
população brasileira.
Porém, na elaboração
de tais estimativas, dados como a renda dos indivíduos não foram contabilizadas,
pois nos autos do Ministério da Saúde - MS; base da consulta; não consta tal
informação. Por isso, o resultado seguiu uma linha secundaria aonde a
qualificação da renda foi dada pela comparação da capacidade de contratar um
advogado privado e o nível social desta pessoa, linha refutável, pois há casos
em que o governo firma vínculos com a categoria de advogados e uma ação pode
chegar ao valor de R$ 238,00 reais, caso ocorrido em São Paulo em 1997. Os
autos do MS também não estipulam quem são as partes responsáveis pelos
honorários dos advogados, podendo haver vários agentes interessados, como indústrias
farmacêuticas, que possuam motivos econômicos para arcar com tais gastos.
Um estudo feito
pelo professor de sociologia da UnB, Marcelo Medeiros, sobre a distribuição de medicamentos para
mucopolissacaridose mostrou a grande concentração de alguns
advogados em um número elevado de processos e em uma região concentrada, o que
mostra uma rede com um relativo interesse para a distribuição do referido
medicamento pelo sistema único, o que desafia a perspectiva de que só a elite é
passível de obter defesa jurídica. Apesar de práticas como estas levarem a uma
configuração excessiva, nos tribunais, de defesa dos grandes laboratórios, como
forma de lobby, tal atividade acaba dando acesso a advogados privados para
indivíduos de menor renda, reduzindo gastos com processos.
Portanto, se o SUS fosse um sistema focalizado seria adequado entender
que, o atendimento de qualquer indivíduo que não aquele em piores condições
feriria a equidade prevista em sua formação. Para
um julgamento da justiça de uma demanda em saúde não importa a origem de classe
do indivíduo, mas sim a avaliação de quais demandas protegem necessidades de
saúde não satisfeitas.
MONITORAMENTO ELETRÔNICO: UMA ALTERNATIVA
Por Filipe
Carcute Dantas e Juhline
Angelina Urani Camargo
Nas últimas décadas temos vivenciado uma realidade
lastimável na sociedade brasileira com a propagação da criminalidade e a consequente
elevação do contingente carcerário. A pena privativa de liberdade --
considerado a partir do séc. XX o meio supostamente mais adequado para
reconfigurar o criminoso -- bem como sua execução na ordem jurídica atual,
mostram-se falidos. Violência, maus tratos, falta de espaço, falta de higiene,
ausência de assistência médica e jurídica são alguns dos muitos exemplos
negativos que afligem nosso sistema penitenciário e demonstram a necessidade de
se repensar meios alternativos de punição, além do modo mais eficiente e
produtivo de execução da própria pena restritiva de liberdade. Desse modo,
procura-se discutir no presente trabalho as diversas facetas da implantação do
chamado monitoramento eletrônico, ressaltando-se pontos positivos e negativos,
bem como a sua presença na realidade penal brasileira.
Segundo dados do DEPEN (Departamento Penitenciário
Nacional) o Brasil contava no ano de 2010 com uma população carcerária de
aproximadamente 437.596 detentos, sendo a quarta maior do mundo, atrás,
somente, dos Estados Unidos, China e Rússia. O déficit carcerário de vagas
contabiliza mais de 130.000, traduzindo-se em presídios, delegacias e
instituições despreparadas e estruturalmente abarrotadas de cidadãos, apilhados
uns sobre os outros.
As diversas situações degradantes
vivenciadas demonstram o descaso com os direitos dos presos, previstos no art.
41 da Lei de Execução Penal, que acabam culminando em rebeliões, revoltas,
agressões e fugas. Torna-se, portanto, inconcebível imaginarmos presídios superlotados,
comportando duas, até três vezes, a sua capacidade, com detentos sem qualquer
privacidade, intimidade e consideração, convivendo diariamente com a redução de
sua autoestima que acaba por afetar não só eles mesmos, mas seus familiares e
amigos, gerando uma inestimável cadeia de revolta.
Diversos estudos comprovam os
problemas gerados pela falta de espaço físico adequado, dentre eles está o
efeito denominado prisionização. A
convivência demasiadamente próxima dos detentos proporcionaria a difusão de uma
cultura típica desse ambiente, com hábitos, meios de sobrevivência, costumes,
práticas rotineiras, modos de ser e pensar que acabam impregnando o apenado e
intensificando o chamado efeito criminógeno,
típico do sistema penitenciário, decorrente dessa imersão do indivíduo na
subcultura prisional. A reclusão, portanto, ao invés de conter o ímpeto delinquente,
ocasiona a maximização do anseio criminoso, funcionando como instrumento
potencializador.
Consoante o panorama exposto, fica
comprovado a necessidade de se buscar alternativas à pena privativa de
liberdade na tentativa de se ver minimizados os efeitos colaterais por ela
provocado, reservando-a, portanto, a situações reconhecidamente
necessárias. Os chamados substitutos
penais, dentre eles o monitoramento eletrônico, constituem meios alternativos
relativamente eficazes na busca da descarcerização, com o intuito principal de
minimizar, senão extirpar, o efeito criminógeno,
proporcionando, sobretudo, a ressocialização do indivíduo.
O monitoramento eletrônico se
constitui basicamente de um instrumento em formato de bracelete ou tornozeleira
que, aderida ao sentenciado, emite constantemente sinais a uma central
responsável pelo monitoramento do individuo. Foi criado ainda no inicio da
década de 60, mas só passou a ser efetivamente utilizado na década de 80, nos
EUA, por determinação do juiz Jack Love. Mais tarde se espalhou pela Europa,
sendo utilizado na França, Itália, Portugal e Alemanha.
Surgiu, a princípio, com o intuito de conferir um
meio a mais de proteção ao cumprimento das decisões judiciais para que o
apenado vigiado não voltasse a oferecer risco à sociedade. No entanto, atualmente, adquiriu maior
complexidade e passou a ser utilizado objetivando três finalidades distintas: a
detenção, a vigilância e a restrição. No primeiro caso o monitoramento
eletrônico asseguraria a permanência do individuo em local previamente
determinado ou autorizado, no segundo, permitiria o controle e o monitoramento
de absolutamente todos os passos do apenado e, por último, com o intuito de
garantir que o individuo não frequente determinados locais ou se aproxime de
determinadas pessoas.
Nos dias atuais, em decorrência do elevado
número de experiências vividas e do amadurecimento de sua aplicação, já é
possível delinear objetivos claros que se pretendem alcançar com a
implementação do monitoramento eletrônico. Cabe, portanto, destacarmos os
principais pontos favoráveis dessa tecnologia.
O primeiro deles diz respeito ao
desafogamento da população carcerária existente em várias localidades do país e
a diminuição do já visto efeito criminógeno. Tal justificativa foi invocada por
diversos países para legitimar a utilização do monitoramento eletrônico em
curta e média escala. Outro ponto notavelmente favorável diz respeito à
manutenção dos vínculos sociais do apenado. Sabe-se que o encarceramento
provoca a interrupção das relações sociais do individuo com seus familiares e
amigos, além de dificultar a construção futura de vínculos profissionais devido
ao estigma social sofrido por quem já esteve preso. Assim, o combate aos efeitos nefastos da
dessocialização mostra-se como um dos pontos fortes desse mecanismo. O aspecto
financeiro também deve ser levado em consideração. Os custos para se manter um indivíduo
encarcerado são exorbitantes (3,5 salários mínimos por mês). Custos estes que
poderiam ser transformados em recursos com o uso do monitoramento eletrônico e
revertidos para implementação de políticas públicas voltadas à educação e
conscientização da população. Por fim, também vale mencionar a minimização dos
prejuízos físicos, emocionais e psicológicos decorrentes do encarceramento.
A
despeito dos importantes benefícios supracitados, o monitoramento eletrônico
não está imune a críticas. Assim sendo, questiona-se, comumente, se o resultado
pretendido, e vale dizer, largamente propagado, de redução da superlotação
carcerária seria efetivamente alcançado. Tal discussão gira em torno do modo de
aplicabilidade do sistema de monitoramento eletrônico, isto é, se será adotado apenas
nos casos de saída temporária e prisão domiciliar, ou se será utilizado em
larga medida, englobando, portanto, regime fechado e prisões processuais. No primeiro
caso, isto é, se utilizado somente nos casos de saída temporária e nas
hipóteses já previstas de prisão domiciliar, o monitoramento eletrônico evidenciará
o estado de máxima expansão do sistema penal, representando tão somente a confirmação
da exclusão do indivíduo condenado.
Por sua vez, no que
concerne ao objetivo, já mencionado, de redução dos custos do encarceramento,
outra crítica se coloca. Alega-se, sumariamente, que os custos oriundos da
implantação e manutenção do sistema de monitoramento eletrônico poderiam
exceder o esperado, haja vista o necessário domínio da tecnologia a ser
utilizada. Entretanto, esta crítica é veementemente combatida, haja vista a
estimativa de uma economia de até 50% (cinquenta por cento) com a
adoção deste sistema, sem contar que, em vários países nos quais houve a adoção
deste sistema, o próprio condenado/acusado – que aceita ser submetido ao
monitoramento – acaba por arcar com parte dos custos. Ademais, não se pode
ocultar o fato de que o encarceramento gera um alto custo social, que será
arcado não somente pelo indivíduo, mas também pela sociedade.
Argui-se ainda que o
monitoramento eletrônico representa uma clara violação à esfera privada do
indivíduo condenado e/ou acusado, uma vez que direitos fundamentais,
incluindo-se aí o direito à privacidade, à intimidade, à inviolabilidade de domicílio,
estariam sendo atentados, fato este agravado quando a fiscalização dos
condenados é realizada por empresas privadas, daí se falar, portanto, em inconstitucionalidade.
Esse é um dos grandes dilemas
que se esbarram à aplicação do sistema em questão, isto é, como garantir o
direito de punir do Estado, sem que isso represente uma discriminação
atentatória a uma série de direitos e garantias fundamentais. Buscando-se evitar um possível decisionismo e
maiores discricionariedades, é importante que as autoridades competentes
realizem uma análise crítica a respeito da questão, ensejando um juízo de
proporcionalidade, necessidade e adequação da medida, tendo em vista que
valores constitucionais estão sendo conflitados: segurança pública versus liberdade individual.
Além disso, não há como
se questionar que o condenado e/ou acusado, assim como afirmado por Laura
Frade, tornou-se objeto de medos e estampagens inconscientes, passando a
“merecer” o ostracismo e o abandono. Nesse sentido, críticos à implantação do
monitoramento eletrônico afirmam ainda que o uso das tornozeleiras ou pulseiras
aparentes levariam à rotulação do indivíduo e sua consequente exclusão do
âmbito social. Sem dúvida este processo estigmatizante resta-se largamente facilitado,
contudo, a solução encontrada ampara-se no desenvolvimento de dispositivos
pequenos e imperceptíveis, ou ainda semelhantes à acessórios comumente usados
pelas pessoas.
Ainda no âmbito dos
argumentos contrários, ressalta-se, por fim, o risco de ocorrência do fenômeno
da superpenalização (fenômeno intitulado pela doutrina estrangeira como net-widening effect), isto é, uma
expansão da rede de controle social por parte do direito penal, ensejando, ou o
recrudescimento das exigências para certos benefícios penais, ou um agravamento
das penas impostas (“voto de desconfiança”).
Assim sendo, para que o
supracitado fenômeno possa ser evitado é imprescindível que o monitoramento
eletrônico seja encarado tão somente como uma alternativa ao encarceramento, disponível a pessoas que não
poderiam gozar, em um primeiro momento, do benefício referente à liberdade
condicional. Em outras palavras, e assim como ressaltado por Carlos Japiassú e
Celina Macedo, é indispensável que o sistema de monitoramento eletrônico amplie
os casos em que há possibilidade do indivíduo permanecer fora do cárcere, sob
pena de, do contrário, efetivar-se o fenômeno da superpenalização.
Em relação ao Brasil, é
recente a discussão acerca do tema no âmbito da justiça criminal - Congresso
Nacional somente se deparou com propostas relacionadas ao assunto em 2007. De
tal forma, a possibilidade de utilização do sistema foi aprovada somente em
2010, com a Lei 12.258, que traz o permissivo legal para utilização do sistema
de monitoramento eletrônico somente nos casos de autorização de saída
temporária em regime semiaberto e nos casos de prisão domiciliar, o que,
obviamente, gerou inúmeras críticas.
Recentemente entrou em
vigor uma nova lei (12.403/2011), que prevê o uso da monitoração eletrônica
dentro do conjunto de medidas cautelares diversas da prisão preventiva. Entretanto,
o dispositivo não regulamenta a aplicação deste sistema, deixando aos estados a
competência para tanto. Assim sendo, e no que diz respeito às experiências-piloto,
diversos estados brasileiros já legislaram sobre o assunto, dentre os quais,
destaca-se: Espírito Santo, São Paulo, Paraíba, Minas Gerais, Rio Grande do Sul
e Paraná.
Contudo, observa-se, neste
cenário brasileiro, uma absoluta fragmentação e ausência de parâmetros quanto à
utilização do mecanismo de monitoramento eletrônico, evidenciando ainda, um
conflito de competência entre as legislações federal – a teor dos artigos 22, I
e 24, I da Constituição Federal, compete à União legislar sobre direito penal e
penitenciário – e estadual, já que muitas destas leis surgiram antes mesmo da
edição da Lei 12.258/2010.
Entretanto, e a
despeito de todas essas problemáticas, é imperativo que se amplie o debate
sobre a possibilidade de adoção deste sistema enquanto medida descarcerizadora,
isto é, viabilizando sua utilização não somente nos regimes aberto e
semiaberto, como nos casos de prisão preventiva, já que, fora dessas hipóteses,
o monitoramento apenas avigora e amplia o controle punitivo estatal, não
oferecendo, em contrapartida, qualquer garantia de reinserção social de egressos
do sistema penitenciário.
Nessa perspectiva,
busca-se evidenciar que, como já mencionado, o Brasil carece de soluções
modernas para enfrentar os inúmeros problemas que assolam a realidade penitenciária.
Assim sendo, é factível que o monitoramento eletrônico não constitui solução
para todos os dilemas enfrentados pelo sistema penal, em outras palavras, não
constitui panaceia para todos os males, mas sim, mostra-se como uma medida
tendente a tornar o sistema penal mais humano, objetivando-se, além da
descarcerização e erradicação do efeito criminógeno, a tão esperada e
necessária reinserção social.
Referências
Bibliográficas
OLIVEIRA,
Janaina Rodrigues; AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli. O monitoramento eletrônico de apenados no Brasil. Revista
Brasileira de Segurança Pública, v.9, p. 100-119, 2011.
JAPIASSÚ, Carlos
Eduardo Adriano e MACEDO, Celina Maria. O Brasil e o monitoramento eletrônico. In:
Monitoramento eletrônico uma alternativa
à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Ministério da Justiça, 2008, p.
26 e ss.
MACHADO, Nara
Borgo Cypriano. O monitoramento eletrônico e a viabilidade de sua utilização no
ordenamento jurídico-penal brasileiro. In: Monitoramento
Eletrônico: Uma Alternativa à Prisão? Experiências Internacionais e
Perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária. Ministério da Justiça, 2008, p. 190.
FERREIRA, Carolina Costa. Monitoramento eletrônico reforça
seletividade do direito penal. Disponível em: http://blog-sem-juizo.blogspot.com.br/2011/02/tornozeleira-e-estigmatizante-e-nao.html. Acessado em 26
de maio de 2012.
FRADE, Laura. Pobreza política e
marginalidade. Disponível em http://www.unieuro.edu.br/downloads_2005/hegemonia_02_05.pdf. Acesso em 27 de maio de 2012.
FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO E ACESSO À JUSTIÇA.
Por Julia Araújo de Melo Alves e Mateus Henrique Andrade de Carvalho
Desde suas origens,
sociedade e direito encontram-se intimamente ligados. A existência de um
prescinde a existência do outro. O direito atua regulando a conduta dos
indivíduos e as relações entre eles e entre eles e o Estado a fim de manter a
ordem que a vida em sociedade requer. Deve agir também como um agente
modificador da sociedade no que diz respeito ao domínio material e ao domínio
da cultura e das mentalidades. Deve ainda promover a justiça, mantendo a
igualdade como um dos princípios da sociedade.
Direito e sociedade estão constantemente
exercendo influência um sobre o outro, provocando modificações significativas
ao longo do tempo. As normas produzidas pelo direito abrangem as mais diversas
áreas da sociedade, sendo capazes de regular as mais diferentes relações. No
entanto, sua atuação, nos dias atuais, não se apresenta tão eficaz e está
desvirtuada do ideal de seu funcionamento.
A ordem jurídica é responsável por proteger
os interesses individuais de todos os seres humanos. Direitos fundamentais,
como o direito à vida, à dignidade e à saúde, devem ser defendidos e
preservados sob quaisquer circunstâncias. A própria Constituição Federal
institui que deve não deve haver para o direito, em qualquer relação social,
qualquer tipo de distinção ou discriminação entre os indivíduos.
Apesar da regulação em todos os âmbitos das
relações sociais, observam-se inúmeros problemas dentro da sociedade. Diante
disso, atribui-se ao direito também a função de estudar meios de minimizar tais
problemas. Dessa forma, o estudo das relações sociais e seus conflitos é a
etapa inicial para a criação das normas que vão reger a sociedade de acordo com
suas necessidades, passando a função do direito por várias etapas.
A criação de normas e sua aplicação são de
extrema importância para um bom convívio em sociedade, prezando-se pelo
respeito aos indivíduos que a constituem. Indubitavelmente, o direito é o
caminho para se buscar a justiça na resolução dos conflitos sociais existentes,
no entanto, não é o único caminho. Nesse sentido, é relevante o fato de que o
judiciário nem sempre faz justiça com as suas decisões. Há, frequentemente,
casos em que outros fatores, como o dinheiro e a influência, se sobrepõem à
justiça.
Ao se
deslocar a questão da normatividade do direito que consta nos enunciados da lei
para as decisões particulares do juiz, obtém-se uma nova visão sociológica que atenta
para as dimensões processuais, institucionais e organizacionais do direito.
Quando falamos sobre garantia e afirmação de
direitos, é necessário, impreterivelmente, que se discuta o acesso à justiça.
Garantido pela Constituição Federal, o princípio da acessibilidade à justiça
serve ao cidadão na medida em que possibilita a proteção de direitos
individuais e difusos de forma eficiente e igualitária. Percebe-se, no entanto,
que, na sociedade em que vivemos o Sistema Judiciário não cumpre inteiramente com
as expectativas de igualdade.
Podemos observar que, em inúmeras situações,
os custos inerentes ao ingresso à justiça se mostram inviáveis, mesmo proibitivos,
para certos estratos da sociedade. Custas processuais e honorários advocatícios
servem de barreira à abertura de litígio por parte de grupos sociais
economicamente desfavorecidos.
Diante das desvantagens da população carente
no que se refere ao custeio do processo judicial, foram tomadas, ao passar dos
anos, várias medidas de redução da demanda financeira incidente sobre o
processo judicial. Podemos destacar a Lei 1060, de 05 de fevereiro de 1950, que
prevê a isenção para as pessoas de baixa renda:
I - das taxas judiciárias e dos selos;
II - dos emolumentos e custas devidos aos
Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça;
III - das despesas com as publicações
indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais;
IV - das indenizações devidas às testemunhas
que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em
serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público
federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o poder público
estadual, nos Estados;
V - dos honorários de advogado e peritos.
VI – das despesas com a realização do exame
de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas
ações de investigação de paternidade ou maternidade.(Incluído pela Lei nº
10.317, de 2001)
VII – dos depósitos previstos em lei para
interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais
inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório. (Incluído pela Lei
Complementar nº 132, de 2009).
Fica efetivado em nível Constitucional, como
direito fundamental, o acesso à justiça somente na Constituição de 1988, por
meio do Artigo 5º Inciso LXXIV. Tal disposição constitucional possibilitou
posteriormente a criação da instituição da Defensoria Pública (Lei Complementar
n° 80 de 12 de janeiro de 1994), que tem como objetivo o auxílio jurídico
integral e gratuito às pessoas sem condições de pagar por um advogado.
Cabe, no entanto, observar que não basta para
que haja o acesso à justiça a redução de barreiras financeiras ao ingresso
judiciário. É necessário, também, que se levem em vista as barreiras sociais à
justiça que se mostram historicamente presentes no Brasil.
São facilmente perceptíveis, principalmente no Sistema Penal, os efeitos
da seletividade judiciária na perpetuação de preconcepções historicamente
presentes em nossa sociedade. Podemos notar com facilidade a discrepância na
porcentagem de indivíduos negros na população carcerária brasileira quando
comparada com a população geral do país.
Fica clara, então, a predisposição do
Judiciário de aumentar ainda mais a exclusão social existente, em discordância
com o princípio de isonomia contido no acesso à justiça.
Devemos, então, quando refletindo acerca do
acesso à justiça nos lembrar que este não se dá apenas mediante a exclusão de
barreiras econômicas ao ingresso no sistema judiciário, mas depende também da
análise da função social da justiça, buscando a igualdade entre os cidadãos
pertencentes aos mais variados grupos sociais.
Bibliografia:
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela
mão de Alice- o social e o político na pós-modernidade
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Lei 1060, de 05 de fevereiro de 1950
Violência contra os homossexuais
Por Elias
Roberto Leão da Silva e Daniel
Sousa Santos
1. Introdução
Nos últimos anos temos presenciado vários movimentos sociais
que estão buscando visibilidade social. O movimento feminismo, o
movimento negro, o movimento LGBT, o movimento dos sem-terra, enfim, hoje
vivemos uma tendência social da luta pelo reconhecimento e
consequentemente pelo alcance de direitos.
Esta
é uma luta permanente, na qual, diversos grupos procuram
elevar, com o emprego de forças simbólicas, o valor de suas capacidades associadas à sua forma de vida. Porém, o que influencia no
desfecho destas lutas não é simplesmente o poder de dispor dos meios de forças simbólicas, mas também o clima, dificilmente
influenciável, das atenções públicas. Quer dizer, quanto
mais os movimentos sociais conseguem chamar a atenção da esfera pública para a importância negligenciada de suas
capacidades e propriedades, mais existe para esses movimentos a possibilidade
de elevar na sociedade o seu valor social, ou, mais precisamente, a reputação de seus membros. (HONNETH, 2003).
Quanto
mais os grupos sociais se organizam e ganham visibilidade, mais estes são reconhecidos como sujeitos de direitos, e podem
reivindicar proteção e atenção estatal às suas particularidades e serem encontrados e
reconhecidos pela sociedade.
O
grupo LGBT é um grupo muito estigmatizado. A homossexualidade, tida,
por vezes, como errada, considerada como crime ou classificada como 'doença' somente são alguns exemplos dos aspectos que uma sociedade
dominante atribui a determinados grupos minoritários/excluídos e como consequência desse estigma, as várias formas que a sociedade se articula para reprimir e
tender a destruir esse tipo desviante do comportamento majoritário.
Esse
preconceito internalizado é exteriorizado pelas diversas formas de violência que são articuladas pela sociedade podendo ser percebidas no
dia-a-dia. Chacotas com menções humilhantes, associação do transexualismo à promiscuidade, casos de agressões, tão-somente pelo fato da
pessoa ser homossexual, que é um crime de ódio, associando a pessoa à suas escolhas particulares. O agressor não distingue a pessoa de suas opiniões, atitudes e escolhas, a
pessoa como ser humano, sujeito de respeito e direito é intrinsecamente associada
e sua escolha particular por determinada orientação sexual ou identidade
sexual. O crime se torna quase que presumido, o fato de ser homossexual
acarreta na legitimação da agressão, não é preciso um fator de desrespeito por parte do agredido ou
uma ofensa contra o agressor, apenas o simples fato de uma escolha pessoal
desencadeia um distúrbio emocional de ódio, por parte do
agressor, para gerar a agressão.
2. Violência no mundo e no Brasil
A
violência é um aspecto importante a ser analisado. A
homossexualidade é ilegal em 78 países do mundo e punível com morte em 5, Irã, Arábia Saudita, Iêmen, Mauritânia e Sudão e algumas regiões da Somália e da Nigéria. A Europa é o lugar onde os
homossexuais são mais atendidos, na América Latina são registrados os maiores índices de violência. Na Ásia, a metade de seus países criminaliza a
homossexualidade.
Em
todo mundo é possível ver um crescente aumento da violência contra os
homossexuais, na França, por exemplo, foram mais de 1500 casos registrados em
2011, um aumento de 5% em relação ao ano de 2010. De acordo com a presidente da associação SOS homofobia, Elizabeth Ronzier, os casos de agressões violentas contra transexuais e lésbicas em locais públicos cresceram 22%. Na Rússia, cerca de 45% afirmam
ter emoções negativas ao lidarem com homossexuais.
No
Brasil ocorreram 1.040 mortes de homossexuais entre 2000 e 2007. Nunca se matou
tantos homossexuais no Brasil como hoje. Além da violência diária que ocorre, totalizando um assassinato a cada 2,3
dias entre 2003 e 2010, a impunidade é dominante,
responsabilizando menos de 10% dos criminosos.
Todas
essas circunstâncias levaram à criação de um projeto de lei
para proteção desse grupo específico, que suscitou muito
debate público e uma acalorada discussão sobre pontos polêmicos do projeto de lei.
3. Impasse na Legislação
Tentando diminuir a discriminação e violência contra os homossexuais o Congresso Nacional buscou
aprovar uma lei, conhecida como PLC 122, que diminuísse
ou acabasse com a violência contra a homossexualidade. Este Projeto de Lei
Complementar altera a Lei 7716/89, que define os
crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, o Código Penal e a Consolidação das Leis do Trabalho ao definir os crimes resultantes
de discriminação ou preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Porém, existem várias discussões sobre as mudanças trazidas pelos artigos PLC 122.
O artigo 4° é um dos que traz discussão sobre a PLC. Assim diz o artigo: art.
4º-A praticar o empregador ou seu preposto atos de dispensa
direta ou indireta: Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco)anos. Para alguns religiosos
este artigo é exagerado, pois faz com que um pai e uma mãe que descobre que a babá
ou doméstica é homossexual e não
quer que seu filho seja orientado por um homossexual esteja sujeito às penalidades previstas no dispositivo em questão.
Outro
dispositivo da PLC alvo de discussão é o oitavo: art. 8°-
a impedir ou restringir a expressão e a manifestação
de afetividade em locais públicos ou privados abertos ao público,
em virtude das características previstas no art. 1°
desta Lei: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos; art. 8°-B Proibir a livre expressão
e manifestação de afetividade do cidadão
homossexual, bissexual ou trangênero, sendo estas expressões
e manifestações permitidas aos demais cidadãos
ou cidadãs: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. As argumentações sobre este dispositivo é
que no pátio de uma igreja, um pastor ou um padre que não queira casais se beijando pode pegar de dois a cinco
anos de reclusão. Estas são algumas das argumentações
utilizadas por líderes religiosos que lutam pela não
aprovação do Projeto de Lei Complementar 122. Não só religiosos, mas também
parlamentares que não lideram nenhum segmento religioso sustentam que essa
PLC é desnecessária, pois o Brasil não
é homofóbico como disse o Senador Magno Malta que, no debate
sobre a PLC 122 na comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa utilizou as seguintes palavras: “o
Brasil não é homofóbico... Quem assassina um negro, assassina um
homossexual, assassina um pastor, assassina um padre, assassina um servidor...
E o que se faz quando isso acontece é
ir a delegacia registrar um boletim de ocorrência”.
Existe
também a defesa da PLC 122 por parte da sociedade e dos
parlamentares. A Senadora Marta Suplicy discorda que vivemos em país não homofóbico, pois para ela, argumenta que não
ver ninguém sendo agredido por ser surdo, ou possuir qualquer
deficiência. Ou seja, a violência
corriqueira que se dá na sociedade não
se confunde com a violência contra os homossexuais já
que esta é direcionada por fazerem parte de um determinado grupo. A
Ex-Senadora Marinor Brito vai no mesmo sentido que a Marta Suplicy e argumenta
que os políticos não querem decidir sobre uma parte importante da população, que segundo o IBGE compõe
10% da população, fazendo com que
o Congresso não queira legislar para assegurar os direitos dessas
pessoas.
As
questões referentes à
homossexualidade são discutidas há
muito tempo na sociedade. Porém, nunca se chegou há
um consenso sobre o assunto. Na atualidade não
é diferente o impasse sobre esta questão. A guerra entre pró
e contra uma legislação de proteção aos homossexuais parece que vai se estender por muito
tempo.
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